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a moça que escreve sem roupa

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‎”Tentar dar o troco achando que não vai se machucar em dobro mais tarde é burrice.”*

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Não tem era uma vez. Apesar de viver de passado. Joga migalhas circenses para delas se alimentar. Sempre preterida, esnoba um falso ego mascarado de virtude. Camaleia-se por tecos de atenção, vende mais do que alma. Mira a vítima e suga seus ídolos, gostos, quereres. Transforma-se. Despersonaliza-se. A cada novo alvo, outra. Na falta de graça, doa o corpo. Exige do outro o que não oferece nem a si mesma. Grita garbo, elegância e concordância para esconder a falta de caráter. Expatriada, respira lembranças inventadas. Amaldiçoa os que levam a bênção de nunca terem sido. Cuspiu seu veneno em minha direção. Troco? Não precisei fazer nada. Secou sozinha, retorcida pelo ciúme e pela amargura.

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*atribuem essa frase à Buk. não achei a original para confirmar

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da audácia da chuva. sem pressa do sol.

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Se a dor do não vivido é mais amarga quando ainda se tem a chance, mas percebe-se que o momento passou e não há resgate que dê jeito, eu não sei. Sei do buraco que senti.

Teremos 90 anos e ainda a mesma cumplicidade. Foi o tempo do beijo que passou. O desejo se transformou, de tanto ficar guardado.

Difícil ter uma conversa dessas, ainda mais na fila do check in internacional. Difícil saber que nos encontraremos de novo só daqui a quinze dias. Sufocante lidar com o medo de que ele se afaste pela minha escolha do não. Água salgada nenhuma conseguiu reduzir a ansiedade: “como será quando ele voltar?” “será que o orgulho ferido fará com que nos percamos, de novo, um do outro?”.

Até quando a consciência pesada dessa fase cafinha vai me perseguir?

Notícias já vieram do além mar. Com elas, a esperança de que chegaremos, seja como for, até o fim. Com a provocação sadia que tanto nos alegra, nos irrita e nos faz falta.

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nesse turbilhão, a descoberta
de amiga que me vende com amor
de amigo não “contável”
e da alergia à lágrima ácida
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Fui vendida por alguns chocolates suíços e duas taças de um bom vinho. Já nem me interessa saber se a da piscina vai colar lá ou não. De coincidências macabras aquele conjunto está cheio. A distância inclui show virado e convite culpado. Pior do que pedir ajuda é ser mal interpretada.

Tenho mania de manias e uma delas é me explicar demais. Pela irritação dos mal entendidos. Só que existe um limite. Certos desentendimentos não merecem nem a saliva gasta.

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Medo de amar – Adriana Calcanhoto

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tear

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Por mais que eu reclamasse, achava bonitinha sua loucura para me re-conquistar. Até aquele dia. Eu o levei ao nosso bar de sempre. Não nosso. Eu que te apresentei. Não que fosse meu. Isso não importa. Estávamos lá, com mais um casal. É lógico que lembraram de você, perguntaram, o assunto veio à tona. Ele, meio ciumento, não gostou, mas matamos o assunto ali. Até você aparecer. Do nada. Justamente naquela noite. Há anos você não ia lá. Os garçons sabiam, tentaram evitar, mas você foi até nossa mesa. Puxou uma cadeira, se sentou com a gente. Provocou-o. Quis provar que me sabia. Ele ficou irritado. Saiu sem dizer uma palavra. Eu te xingava e te batia, torcendo para que você ficasse longe e não me abraçasse. Ele voltou. Puxou o casaco pro lado e mostrou uma arma. Mandou você se afastar e nos ameaçou. Você, não menos louco, fez o mesmo. Por essa ele não esperava. Eu gelei. Vocês pareciam animais. Preocupados com a “vitória” e com a posse da razão sem sentido. Personagens de um filme triste. Solitários. Eu não queria fazer parte. Não fiz. Pavões e galos de briga nunca me atraíram.

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eu conheço seus cantos, eu te conto pelos contos

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Para me envidar e provar a mim mesma que estava errada tentei namorá-lo. Até que o cheiro nauseante dele me convenceu do contrário. Não, não era o perfume. Ele mudou. Não adiantou.

Como lembranças e gosto, meus relacionamentos se guiam pelo cheiro.

O último exalava flores. O aroma da magnólia era um convite. O da ageratum purificou e limpou odores passados. As acácias e miosótis trouxeram o amor e a fidelidade. Nunca mais senti um ciclame, vocês sabem, símbolo olente do ciúme. Vivíamos com o reconhecimento das dálias, com o amor das acácias, com a superação das petúnias, com a tranquilidade das violetas.

Até que, sem uma flor de lis se quer, ele me deu um copo de leite.

Sem ele, perdi o faro, meu olfato ficou confuso, sujo, viciado.

Como o hálito do fogo que compromete o que lambe, o dele impregnou-se em tudo. Assim eu pensava.

Hoje, entendi que ele está em mim. Infiltrado em cada poro, em minhas entranhas. É o meu cheiro que me lembra dele. O cheiro da minha pele, do meu suor, do meu sangue.

Como os cactos, minhas folhas e pétalas reduziram-se a espinhos que, além de afastar predadores, rasgam minha pele e me tornam uma flor sem perfume. Não amo mais. Não sei o que é paladar. Não tenho prazer. Mas ainda me lembro dele.

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para você, que provocou a inspiração.

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Dos elos: Quintana estaria certo?

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É estranho esse sentimento. A tentativa de proteção. O pseudo mistério. A ilusão. A transparência à revelia. Mais do que queria. Mais do que poderia. A impressão de que um letreiro em néon pisca indicando desejos, pecados, vontades. E medos. A tentativa de mostrar aos que importam que sim, que é – ou era – possível acreditar nas pessoas. O medo de ter chegado ao ponto de não conseguir mais acreditar. A observação. Das pessoas. Das brigas por atenção, por vaidade, por carência.  Das traições. Não relativas à fidelidade e sim à lealdade. Tudo e todos se tornaram dispensáveis? Da necessidade – doentia – de afirmação. De viver de comparação. A todo instante. A qualquer custo. A cumplicidade ficou esquecida? Um olhar cúmplice é tão bonito, tão intenso. Tão maior que tudo isso. E lá vem o lado “sentimentalóide” de novo. E a vontade de não querer. Não querer mais sentir. Não querer mais provar. Não querer mais arrumar desculpas. Não querer mais entender. Não querer mais confessar. A barreira era de mentirinha. Lacunas, brechas. Revelações sem pensar que poderia ser diferente. Sem querer acreditar que seria só mais uma luta perdida. Que seria só mais uma. Sem ouvir o que, lá no fundo, gritava. O saber não queria que fosse verdade. Havia fé. Como se não houvesse temor ao risco. Como se pudesse sempre se reerguer. E perdoar. Até uma hora em que as evidências atropelam, esbofeteiam a confiança. Não existe outro jeito, é preciso acordar. Por mais que o sonho pareça real.

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E ela ainda diz que a doida sou eu!

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Brincavam de pique-esconde no recreio. Ele conhecia bem o colégio, judiava e a deixava desorientadinha tentando achá-lo. Só aparecia depois de se divertir bastante. Mas, na visão dela, ele sempre surgia como o herói que a ‘salvava’. E deu nisso: a imaginação mandou, ela se apaixonou e o que era brincadeira virou obsessão.

Para vigiá-lo, por mais que quisesse algo diferente, fez o mesmo curso que ele, na mesma faculdade. Depois, sugeriu abrirem um negócio juntos e, assim, trabalham e vivem até hoje, morando, não juntos, mas bem perto.

Não que essa proximidade toda adiantasse. Ele sempre estava acompanhado; uma mulher atrás da outra, quando não as tinha ao mesmo tempo.

A cada nova namorada, ela surtava. Ficava de tocaia, imaginando eles se tocando, se beijando. Gemia e se torturava com as cenas – do que poderia estar acontecendo – que passavam à sua frente, como um filme.

Ela não namorava, não tinha vida própria. Persegui-lo consumia muito tempo. Depois das (ou durante as) espreitadas bem sucedidas, pagava pelo sexo e se esbaldava ao pensar nele, sozinho. Não é nefasta, nem feia, nem mal amada. Recusava pretendentes, porque só ele lhe interessava.

Um dia, ela resolveu ‘experimentar’ o dito. Convidou-o pra jantar, na casa dela. Ele nunca foi difícil. E, durante esse tempo todo, ela sabia que seria moleza. Mão nisso, aquilo na mão, pernas, posições trocadas. Nada. Nem as variações, nem o básico a agradaram. Tentou bater, apanhar e tudo mais. Imagine o que quiser; eles tentaram. E nada.

Achou que estava curada. Começou outro relacionamento e nada. E mais outro. E outro. Tentou  até com as namoradas e affairs dele. E nada. Nem uma gozadinha sequer.

Mas no dia em que conseguiu desviar a atenção dele, que estava voltada para uma vagabunda da mesa ao lado, gozou ali mesmo, no bar.

A excitação vinha do controle, da perseguição. E não de tê-lo ou estar com ele. Ele não podia ser de ninguém. Nem dela. Gostava do sofrimento, do amor platônico, do inatingível. E dos homens que se submetiam à loucura e topavam acompanhá-la nesse jogo doentio.

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Entranha coraçonada

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Alimento egos e mentes deturpadas. Distorço realidades. Crio doenças, taras e dependências. Sou a droga dos emocionalmente perturbados. Dos que só vertem elogios líquidos. Fantasio-me de coragem e sorrisos e te vicio. Tripudio. Despersonifico os que fogem para que aprendam, comam e cuspam. Dou vazão a medos e obsessões. Cobro. Cego. Mato. Confesso e, mesmo assim, você me deseja.

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Se Deus não faz…

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Tomou seu banho, escovou os dentes, rezou e foi deitar abraçado a seu lagarto de pelúcia. As garrinhas macias faziam cosquinha em seu rosto, enquanto ele se aconchegava na cama.

Acordou com sua mãe puxando não só as cobertas, mas também seus pequenos bracinhos e levantando-o de supetão. Levou um tapa, depois outro e outro. Foi arremessado contra a cama, como nem bichos peçonhentos seriam. Da forma que caiu, ficou. Apenas se encolheu, esperando o próximo sopapo, que não existiu.

Ela foi retirada do quarto enquanto gritava que não havia parido criatura tão desalmada. Ele, assustado, permaneceu inerte, sem entender.

A ama, então, explicou-lhe que sua avó morrera.

Sua maior tristeza, porém, era não saber porquê, depois desse dia, a mãe parou de ajudá-lo com as lições do colégio, o pai não o levava mais a jogos de futebol e ele só fazia as refeições apartado de toda a família. Virou um estranho em sua própria casa. Quando muito, tinha a companhia de sua ama que o aninhava em seu colo quente e convidativo.

Ele não pôde ver o caixão, nem ir ao enterro.

E um detalhe ainda o perturbava: onde estaria o presente? Sim, aquele cachecol todo torto, de cores misturadas e textura áspera que a avó fizera pra ele, anos atrás.

Ele se lembrava bem. O dia estava frio. Viu-a debilitada, com olhar perdido e triste e enrolou o cachecol em seu pescoço. Apertou bem forte, para que não entrasse nem um ventinho. Ao pensar em seus pais, apertou mais um pouquinho. Depois mais, ao sentir a saudade cortante de seu avô. Então, usou um pouco mais de força. Mais. E mais. Até que, como um bom menino, atendeu a todos os pedidos.

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Intento de corpo vivo

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Não possui matéria viva suficiente. Não tem dentro. A custo um único resquício buliçoso: os olhos. Eles atraem o olhar de sua vítima e, nele, fixam-se. Invadem-na, devastam-na, devoram-na.  Sua função, não é somente ver, é sorver-lhe a alma.

O fim não é imediato. Tem-se, antes, o deslustre, a apatia mordaz. Como lâmpada que perde o brilho, a vida vai se esvaindo, aos poucos, do corpo inerte. No desenlace, uma fugaz centelha anuncia o último suspiro. Cumpre-se o vaticínio: enluta-se o sonho e a carne se desfará.

O sugador infame de almas, então, banqueteia-se dos restos, da dor. Regala-se sobre as cinzas. Perpetua-se de forma expirante pela soma de tudo que foi perdido. Almeja a transição inversa, quando não mais será apenas um amontoado de sobras funestas.

O contorno de linha de um corpo começa a surgir, um quase homem.

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# conto inspirado no livro ‘A Passagem Tensa dos Corpos’ de Carlos de Brito e Mello.

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Atrevida?

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Hoje, tem conto meu aqui.

O que acham? Estou muito atrevida?

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Má língua dos milagres

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Era comparada a um morteiro. Cotovelos cascudos e foveiros denunciavam que via a vida pela janela. Sua língua trabalhava com presteza. Todo o mal a ela era associado. Ouvia, repassava; deduzia, inventava; induzia, incitava.

Por conta de suas delações, ele estava de castigo. Sua mãe trancou as roupas num dos cômodos e o fez vestir uma saia, imaginando que a vergonha o impediria de sair. Enganou-se. Ele amarrou a saia no meio das pernas e fugiu. Era a final do campeonato de sinuca.

A fofoqueira, de plantão, observou tudo, alertou a mãe e foi com ela, alfinetando-a, até o único bar do vilarejo.

O jogo estava prestes a começar. Posicionou-se e, quando ia dar a primeira tacada, viu seus amigos afastarem-se da mesa, espantados. Antes que pudesse imaginar o porquê, sentiu a primeira ‘guarda-chuvada’. Com o impulso, o taco acertou violentamente uma das bolas que ricocheteou e quebrou o ‘valioso’ troféu, relíquia sentimental do pequeno povoado.

Tacos empunhados, partiram para cima da bisbilhoteira e a mataram à tacadas. Arrancaram seus olhos e, no lugar, colocaram as bolas preta e branca ocupando as cavidades oculares. Retalharam-lhe a língua, em retaliação.

Enterraram-na em praça pública. Em volta de seu sepulcro, a cidade, que hoje a homenageia, foi erguida.

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Sirene

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Menina da cidade grande, no auge da sua candura experiente e descolada, era ‘novidade’ para os meninos do interior. Sempre tinha pretendentes e, às vezes, mais de um namorado, ao mesmo tempo.

Nesse dia, sua avó pediu que mudasse a plaquinha do jazigo da família e ela prometeu que o faria. Mas, entre um ‘amasso’ e outro, fugindo de confusões e flagras, lembrou-se de passar na serralheria só no final do dia.

Não sabia que cemitérios de cidade pequena ‘fecham’ cedo e entrou, sem se preocupar. Depois de cumprir a promessa, foi visitar o túmulo de um antigo namorado. Não sabe por quanto tempo ficou, ali, deixando-se invadir pelas lembranças dos momentos tórridos que passaram juntos.

Anoiteceu sem que ela percebesse.

Estranhou a falta de iluminação e da Lua. Aos ‘trancos e barrancos’, perdendo-se entre flores de plásticos e fotos 3×4, tropeçando em jardineiras improvisadas, sendo arranhada pela ponta dos crucifixos e quinas das sepulturas, encontrou a saída. Forçou a porta e nada. Gritou e nada. Esperou e nada.

Até que viu, ao lado, atrás de uma planta amarelada, um botãozinho vermelho. Apertou.

Uma sirene ensurdecedora foi disparada. Em questão de segundos, todos os moradores estavam, do lado de fora, fofocando, aguardando o desfecho e fazendo apostas.

E, de repente, sai ela. A doce ‘menininha’. Corada. Vestido rasgado. Joelhos e palma das mãos esfolados. Cortes pelo corpo. Risadinha de canto. E sozinha.

Beatas rezavam. O padre a benzia. E todos especulavam.

‘Cadê o moço?’ ‘Ela deve ter matado o coitado por uso excessivo e enterrado aí.’ ‘Dizem que é tarada, insaciável.’ ‘Ela não é a namorada do filho da Dirce?’ ‘Não, ela namora o filho do Sr. Ernesto.’

Os namorados não quiseram explicação. Um até aceitava o outro. E, talvez, aceitariam o fato de ela fornicar, com um terceiro, no cemitério. Mas a cidade inteira estar ciente e comentando era inadmissível. Podiam dividi-la, desde que apenas os envolvidos soubessem. Ser motivo de chacota era, para eles, a parte mais dolorosa e, para isso, não havia perdão.

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[*Inspirado em uma twittada despretensiosa de um amigo. Sinapses alteradas. Obrigada!]

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Ponto pra você; final pra mim

 

Já disse aqui algumas vezes que sou teimosa.

[Teimoso: aquele que é dado a teimar; obstinado; pertinaz. – Teimar: insistir, obstinar-se. – Pertinaz: persistente. – fonte: Dicionário Aurélio.]

Mas tudo tem um limite. Ou, pelo menos, deveria ter. Eu sei que tenho o meu. E, às vezes, insisto; mesmo sabendo que já estou além. Para ter certeza que fiz o melhor. Que tentei. Que não me entreguei diante da primeira dificuldade. Da segunda, da terceira… da décima.

Mas, até os mais cabeças-duras, um dia, cansam. Percebem que estão se debatendo em vão. Acham que estão lutando por ‘algo ou alguém’ quando, na verdade, estão sozinhos porque ‘algo ou alguém’ está remando em sentido contrário.

Até eu, que sou mais boba, sei disso. E, por mais que me entristeça, preciso reconhecer quando a hora chega. [Sim, eu fui até o fim…]

Poucos conseguem abalar minha esperança, minha fé. É como um terremoto. Algo se quebra. Mas sei que há muitas coisas e pessoas pelas quais vale apena lutar e, por elas, ainda acredito nas reticências…

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“…Não vim até aqui
Pra desistir agora
Entendo você
Se você quiser ir embora
Não vai ser a primeira vez
Nas últimas 24 horas
Mas eu não vim até aqui
Pra desistir agora

Minhas raízes estão no ar
Minha casa é qualquer lugar
Se depender de mim
Eu vou até o fim
Voando sem instrumentos
Ao sabor do vento
Se depender de mim
Eu vou até o fim…”

Até o fim – Engenheiros do Hawaí


Vácuo

 

Não havia explicação. Era estranha e mais incômoda que o normal.

Veio de repente, sem avisar. Ela não sabia de onde aquela dor surgia.

Aperto no peito, sensação de sufoco. Vazio.

O que está acontecendo comigo?

Passou noites em claro. As lágrimas corriam soltas e ela deixava. Precisava colocar aquele sentimento pra fora. Seja lá qual fosse.

Só o tempo, eu sei, eu sei. Mas porque, quando queremos agilidade, ele anda tão devagar?!

Ela sabia. Mas, naquele momento, isso não a consolava.

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[Os buracos negros, assim como outros objetos cuja atração gravitacional é extrema, retardam o tempo significativamente]

Nem a luz lhe consegue escapar

 

Algumas pessoas passam em nossa vida como estrelas cadentes, numa velocidade alucinante mas, mesmo assim, fazem a diferença.

Nossos olhos ficam fixos no céu. Nem piscamos para não perder um só segundo. Fazemos o pedido, tudo direitinho, desejando que ela fique, que não se vá.

Mas não adianta. Só nos resta vê-la indo embora lá longe… e ficar apenas com as lembranças que, com um pouco da magia que restou, nos iluminam de vez em quando; através do sorriso que surge solto, leve, renovando a certeza de que foi verdade, enquanto durou.

Mas a estrela, pela sua cadência, sabia do fim e se preparou. Dizem que, quando uma estrela morre, pode virar um buraco negro. E, quando isso acontece, tudo muda. Fica quase impossível reconhecer aquele brilho que um dia nos encantou.

Em sua nova forma, ele diz a que veio. Precisa apagar todos os traços e lembranças de sua antiga existência. A magia se dissipa, vira pó. Nem a luz lhe consegue escapar.

 

“I’m never speaking up again
It only hurts me
I’d rather be a mystery”
My stupid mouth – John Mayer
 
 

Algumas coisas não mudam com o tempo II

 

[A primeira parte está aqui, se quiserem ler: Algumas coisas não mudam com o tempo]

 

– Filha, pode falar? Onde você está?

– Sim, posso. Acabei de chegar em casa.

– Você pode vir aqui pra minha casa agora?

– Agora? Porque, pai? Aconteceu alguma coisa? Tá tudo bem?

(…)

– Como assim ele está aí?

(…)

– Sim, eu disse pra ele. Inclusive, já sei sua resposta.

– Mas… (…)

– Sim, eu disse que quem decide isso é você.

– Pai, chama ele no telefone. Vou falar para ele vir aqui pra casa e eu converso com ele. Isso precisa parar.

– Filha, mas ele quer cantar uma música pra você. E confesso que fiquei curioso. Agora quero ouvir. Então, seja uma boa menina, venha pra cá.  Ah, e traga seu violão. Ele esqueceu o dele.

– Ah, não pai. Isso não é hora pra brincadeiras.

– Sei que você sofre com isso e ele também. E adianta? [Não] Pois é, então, bom humor é a melhor solução. Mas eu prometo não rir. Sua mãe disse que se controla também.

– Não quero.

– Filha, ele não vai sair daqui. E é melhor você vir antes que eu diga a ele que concordo e abençoo.

– Você não faria isso comigo.

(…)

– Faria? Isso não tem graça, sabia?! Ok, estou indo praí.

“… Perdão, se ouso confessar-te
Eu hei de sempre amar-te
Oh flor meu peito não resiste
Oh meu Deus o quanto é triste
A incerteza de um amor
Que mais me faz penar em esperar
Em conduzir-te um dia
Ao pé do altar
Jurar, aos pés do onipotente
Em preces comoventes de dor
E receber a unção da tua gratidão
Depois de remir meus desejos
Em nuvens de beijos
Hei de envolver-te até meu padecer
De todo fenecer…”

(Rosa – Pixinguinha e Otávio de Souza)

– Já não se fazem mais serenatas como antigamente! Na verdade, nem podemo chamar isso de serenata, né?!

– Pai, tá doido?!

– É sério, filha! Agora entendo.

– Meu amigo, Pixinguinha revirou no túmulo agora. Vem aqui, vou te dar umas dicas. Com ela você não tem chances, desiste. Mas você é um moço bom, ainda pode pegar o jeito. Aceita uma cerveja?!

– Pai, por favor, não faz isso!

– Os jovens de hoje perderam o humor, só pode. Fique tranquila, está tudo sob controle. Gosto dele, filha, e ele precisa de ajuda. Aproveita e pega as cervejas lá pra gente, vai…

 


Cuidado, tente me ver e não ‘me vista’!

 

(…)

… No Reveillón, eu separei meu vestido e sandalinha brancos. Para poder usá-los, tive que pintar as unhas de vermelho. Sim, porque senão, corria o risco de eu não ser vista, de virar o próprio Gasparzinho. Ou de que alguém, que gostasse do modelito do vestido, resolvesse ‘me vestir’ para celebrar a virada…

(…)

 

Lá no Céu você pode ler o texto completo!

 

 

 

 


Zé ou Mané?

 

Outro dia, pelo Twitter, estava conversando com minha amiga Única e Exclusiva sobre os Zés e os Manés.

O Zé é inteligente, divertido. Um conquistador talvez atrapalhado, mas nunca ‘barato’. Tem uma cara de safadinho, detalhe que encanta e atrai. É aquele que sabe o que faz. Sabe como conquistar, envolver, seduzir. Com malícia, sem maldade. Sabe valorizar cada momento, cada necessidade da mulher. Dá atenção na medida, sem sufocar. Sabe a hora de se retirar para deixar que a saudade aumente o desejo. Sabe estar presente e, de alguma maneira, nos faz sempre sentir especiais.

O Zé não é perfeito. Pelo contrário. Mas sua imperfeição é o que o torna tão interessante. Porque ele tem consciência de suas falhas e não as esconde. Não quero dizer que ele expresse sempre os sentimentos abertamente (estou falando de um homem de verdade e não dos de filmes). Mas ele não se esconde atrás da máscara de ‘perfeitinho’. Ele se mostra como é. Um galanteador. E diz o que quer e a que veio. Não precisa esconder o que sente.

E chegamos à conclusão: Já não se fazem mais Zés como os de antigamente. Até os originais estão dando defeito.

Quanto aos Manés, existem fábricas por todo mundo. Eles se espalham como praga. Estes são os que não assumem seus atos. Escondem-se atrás da figura de bom moço. Fazem juras de amor eterno, mas, na hora H, não transmitem confiança. Porque eram apenas palavras jogadas ao vento. São meninos e não homens – e, devo ressaltar, isso não tem nada a ver com a idade. São imaturos. E, na maioria das vezes, mal resolvidos e inseguros. Precisam de auto-afirmação constante. Preocupam-se com quantidade e não qualidade.

E aí, surge a questão: como resolver este problema?

=> Importação – eu tenho grande simpatia pelos Italianos e a U&E sugeriu que Portugal também vale a pena;

=> Fabricação – esta idéia terá resultados só a longo prazo… já imaginaram o trabalho?! Além disso, eles demoram a crescer e ficar “no ponto”. Quanto a amadurecer então, nem se fala…;

=> Curso Especial – “Como se tornar um Zé em 5 lições básicas”. Ok, talvez precisemos de mais passos até o sucesso. E lógico que alguns ficariam de recuperação.

Sim, será um trabalho árduo. Mas, se fizermos direitinho, não haverá arrependimentos. Até porque com um plantel bem formado poderíamos abrir uma empresa inovadora: “Zé Delivery”!!!! (mas só depois de termos os nossos…)

Para que nosso plano tenha sucesso, faremos pesquisas de mercado e alguns experimentos – sabe como é, o olho do dono é que engorda o boi… Só assim saberemos quem são os verdadeiros Zés… e poderemos oferecer um serviço de qualidade, único e exclusivo! … Como todas merecem…

Além disso, montaremos um manual. As mulheres poderão usá-lo para identificar os Zés espalhados pelo Mundo e os homens, assim esperamos, talvez aprendam alguma coisa… Aguardem!!

* Texto escrito em parceria com a Única e Exclusiva. Obrigada, U&E, pelas conversas divertidíssimas e pela ajuda!


Um amor de confusão…

Sentamos pra conversar. Ela estava nervosa, desconcertada. Mal o conhecia e ele disse, de repente, que a amava. “Como ele pode me amar, Menina? Nos conhecemos há tão pouco tempo. Não sei quase nada sobre ele, nem ele sobre mim.  Ainda nem nos beijamos. Será que ele é louco, exagerado, cafa ou realmente sente isso?”

“E o caso da Babi, lembra? Ela conheceu o Pedro pela internet. Conversaram por alguns meses, se viam eventualmente pela cam. Nunca haviam se encontrado. Faltava o olho no olho, o toque na pele. E ele, num belo dia, disse que a amava. Que tinha certeza que com ela seria diferente”.

Nossa conversa durou horas. E, a cada lembrança, a cada exemplo nos confundíamos ainda mais.

Será que o amor está sendo banalizado? Não só o sentimento. A frase propriamente dita – EU TE AMO.

Ou será que estamos com tanto medo de sofrer que tentamos racionalizar o sentir buscando uma certeza irreal, inexistente? Será que os traumas e infortúnios do passado nos assombram ao ouvir falar de amor em tão pouco tempo de relacionamento? (ou quando ainda nem existe um ‘relacionamento’ propriamente dito?)

Um homem não pode amar uma mulher apenas pelo o que ela representa pra ele naquele momento? Não pode ter acontecido o ‘amor à primeira vista’? Ou os meses de conversa no msn não podem ter sido, para ele, mais importantes que qualquer outra presença física? Não pode ser amor aquele sentimento imperfeito, bagunçado e sem nexo que ele sente por ela?

Não existem regras, limites ou tempo mínimo necessário para que um sentimento nos invada.

Então porquê nos assustamos tanto com a efemeridade de uma frase como essa?  Porquê questionamos tanto? Porque tanta desconfiança?

Na mesma conversa, lembramos também daquelas vezes em que acreditamos, mesmo sem entender, e o resultado foi desastroso. Poderia ser paixão, desejo, empolgação, vontade de fazer dar certo. Ou poderia ser um típico cafa querendo apenas derreter o coração de mais uma pobre coitada iludida e assim conseguir levá-la pra cama. Nestes exemplos, não chegou a ser amor. Somente confusão. Brigas. Choro. Cobrança. Desilusão.

E deve também haver os casos de sucesso… Onde uma simples troca de olhares despertou o maior dos sentimentos e foram felizes… se não para sempre, pelo menos, enquanto durou.  

Talvez não nos caiba entender. Talvez “… saber amar é saber deixar alguém te amar…”. Talvez devêssemos apenas viver mais soltos… sem nos preocuparmos com padrões, tempos, paradigmas. E, talvez, possa ser amor…

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O texto está meio solto e os pensamentos meio embaralhados. Até porque eu mesma fiquei confusa. E acho que ainda estou. De verdade, eu responderia que ‘não sei’.

Escrevi este texto há algum tempo. Mas o deixei guardado, inacabado. Só que ao ler este post da Miss muita coisa veio à tona e junto a vontade de postá-lo.

O que vocês acham?!


Via de mão dupla: olhe para os dois lados ao atravessar


Indignação

 

Manipulação, dominação, controle. De pessoas ou situações. Por maldade, insegurança, inveja.

Jogo de poder, mentira, trapaça.

Aproveitar-se do sentimento bom que uma pessoa nutre pela outra. Usar a culpa com a qual ela não consegue lidar, como arma.

Repressão não só física, mas também mental. Humilhação.

Golpe de Estado. Golpe da barriga. Engodo. Não foi engano. Havia intenção de conseguir alguém ou algo, misturando sentimentos, transformando pessoas em coisas sem valor, mercadorias, moeda de troca.

Jogo com a vida alheia. Como se lhe pertencesse. Como se certo fosse.

Chantagem. Abuso. Trauma.

Duas vidas que se unem por uma fraude. Entrelaçadas. Misturadas. Ficção. Nunca houve a realidade, a cara limpa, a coragem.

Uma vida que começa no meio do furacão. Inocente. Desavisada. Maltratos. Indiferença. Consequências.

 

::: Desculpem o desabafo. Algumas situações e atitudes me revoltam :::


Amor despedaçado

O começo foi agitado, intenso. O perigo excitava. Por ser proibido e secreto instigava a imaginação e os sentidos. Era um caso? Um affair? Definitivamente, uma aventura, uma loucura. E, naquele momento, os dois queriam a adrenalina. 

Becos escuros, ruas desertas
Sombras, sussurros, noites e frestas
Frio na espinha, beijos roubados
Sexo e vertigem, amor e pecado

Mas a surpresa de ontem, hoje é corriqueira. Normal. Repetições. Menos surpresas. Rotina. Envolvimento. Sentimentos expostos e compartilhados. Desejos revelados. Vontades que mudam. Expectativas.

Tudo o que um dia
Já foi um motivo
Pra tanto mistério e prazer
Apodreceu o nosso fruto proibido
E eu vim aqui hoje só pra dizer

Apodreceu? Cansou? É preciso mais? Pedir, seria cobrar? Se impor, seria colocar contra a parede? Como dizer? O que falar?

Eu quero te olhar
De um lugar diferente
Eu quero a chave
A chave da porta da frente
Eu quero agora
E eu quero pra sempre

Pronto. Mais claro, impossível. Disse o que queria. O que esperava. Isso não implica perder ou tolher a liberdade, o romance, a paixão, o desejo. Signfica agregar. Compartilhar. Assumir. Ter intimidade. Mas porque o sumiço? Porque a falta de resposta? O que causou a mudança de atitude? Chamadas não atendidas, sem retorno.

Restos e sobras, porta dos fundos
Senhas secretas, sonhos ocultos
Fugas, mentiras, culpas e falhas
Muita espera pra pouca migalha

A ausência e a fuga são as respostas. Resto, sobras não são mais suficientes. Esperou, teve paciência. Não perdeu o controle, nem a razão. Não maltratou. Não mudou. Continuou da mesma maneira. Firme. Forte. Sabendo o que queria. E não era isso. Definitivamente, não era.

 

* “A chave da porta da frente” – Frejat e Leoni


Abismo

Ele tem medo
Não demonstra
Mas age assim
Aumenta as exigências
Torna inviável, inatingível
Impossível satisfazer
 
A ferida não cicatriza
Não deixa ninguém se aproximar (de verdade)
Não deixa ninguém curá-la
Gosta de cultivá-la
É o que mantém viva a esperança
de reviver aquele amor
 
Embora nunca admita
E continue a procurar
A carne sangrando prova
Que o desejo existe
Que o melhor que ele pode ser não morreu
 
Está apenas adormecido
E não quer ser acordado
Pelo menos, não por qualquer pessoa
Somente ‘ela’ pode derreter o gelo
Esquentar o frio
Devolver o sorriso
Dividir a vida
 
Quando sente muita falta
Se agarra (procura) a pessoas
Que tenham alguma característica da que deseja
Um traço parecido
Algo que lembre, conforte
Acha que ao juntar cada pedaço
Se sentirá completo
Ou menos vazio
Mas isso só camufla, não supre
Aumenta a dor
Petrifica
Desumaniza

E você, tem ou quer um jogo deste?

Em uma reunião de família, mãe e filha andam pelo salão de festas cumprimentando os parentes… tias-avós, primos de 15º grau, tios solteirões metidos a galã, entre outros…

Ao se encontrar com a sogra, Maria Luisa tenta agradá-la, puxar assunto, ser amável. A velha senhora não colabora e quase não responde. Dá atenção apenas para sua neta Bel que, inocentemente, diz:

– Vó, quer um jogo de cintura?

Maria Luisa, já imaginando a confusão, tenta interromper: “Quê isso, Bel!?! Vem aqui comigo, vamos ali falar com seu tio-avô Hermenegildo.”

– Mãe, é aquele negócio que você falou hoje com o papai. Eu quero um também. E a vó…

– Bel, você está confundindo. Deve ter visto isso na televisão. Imagina, Dona Cecília, criança tem cada ideia, né?

– Não, mãe. Foi naquela hora que você e o papai estavam conversando sobre a vó Cecília. Vó, a mamãe disse que a senhora também não tem. Vou pedir pro papai comprar um pra mim, a senhora quer um também?

 

* Em homenagem ao dia das crianças; à inocência, à simplicidade, à alegria descompromissada, às risadas soltas… e às lembranças boas que temos da nossa infância e que nos permitem, de vez em quando, voltar a ser crianças…